Sem novos kits escolares, professores da rede municipal de BH improvisam e doam materiais para alunos carentes

A dificuldade de as escolas adquirirem novos kits escolares para os alunos da rede municipal de BH devido à falta de recursos em caixa e pelo comunicado em cima da hora da Prefeitura de Belo Horizonte que, neste ano, diferente do que ocorreu nos anteriores, decidiu descentralizar a compra dos materiais, deixando sob responsabilidade das próprias instituições, está fazendo com que professores tenham que improvisar para auxiliar os estudantes no complemento de materiais que estão em falta no início do ano letivo.

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“É uma situação frustrante; nos sentimos completamente impotentes”, desabafou uma professora da rede municipal de Belo Horizonte ao BHAZ. A escola onde leciona não tem verba na caixa escolar para adquirir os materiais dos kits, sendo obrigada a trabalhar com itens remanescentes do ano passado — muitos dos quais já estavam em falta.

A professora, que terá a sua identidade preservada, revelou que a falta de verbas já era um problema recorrente na instituição. No entanto, com a transferência da responsabilidade pela compra dos kits escolares para as escolas, comunicada dias antes do início das aulas, a situação se agravou. Ela trabalha em uma instituição localizada no bairro Goiânia, na região Nordeste de Belo Horizonte. “Estamos fazendo o que pode. Como sobrou material do ano passado, conseguimos entregar um kit razoável, porque muitos dos nossos alunos não conseguem comprar material agora”, explicou.

Entre os materiais distribuídos para os alunos do primeiro e segundo ciclo, segundo a professora, estão um caderno de brochura, borracha, lápis de escrever, lápis de cor e tesoura. Itens essenciais, como apontador, giz, estojo e régua ficaram de fora. “Pegamos tudo o que podíamos, mas não sobrou mais nada. É complicado, porque nos planejamos para dar aula e realizar as monitorias, mas tudo fica comprometido quando os estudantes não têm nem o básico. E esses materiais são um direito deles. A prefeitura fala que vai mandar a verba só que não dão previsão alguma”, desabafou.

Kits de ‘primeiros socorros’”

Outra professora relatou que nem todas as turmas receberam lápis de escrever, como foi o caso das classes do terceiro e quinto anos. “Todos receberam cadernos, mas, por exemplo, o conjunto de canetinhas foi distribuído apenas para algumas turmas. Já a cola branca não tinha em estoque, então, tivemos que substituí-la pela colorida. Sobre os lápis de escrever, a coordenação informou que a entrega ficaria a critério de cada professor. Como meus alunos ainda são pequenos, estou distribuindo aos poucos. Estamos até chamando os kits de ‘primeiros socorros’”, contou.

Para tentar minimizar o problema, a professora decidiu doar alguns materiais dos filhos que ainda estavam em bom estado para os alunos. “Separei lápis, borrachas e outros itens que meus filhos e eu usamos no ano passado. A escola fica em uma comunidade de baixa renda, então, para os alunos que realmente não têm condições de comprar e continuam aguardando, fiz a doação”, contou.

Sem verba

Uma monitora de uma escola da região de Venda Nova, em BH, afirmou que a falta de verba tem impedido a compra dos materiais dos kits escolares. Como alternativa, as sobras dos itens do ano anterior foram usadas para montar um improvisado. “O uniforme veio completinho, vieram três cadernos, lápis de cor, apontador, tesoura, régua e de escrever. Porém, não veio borracha nem cola. Vieram poucas coisas, mas pelo menos recebemos”, disse a mulher, que tem um filho que estuda na escola.

Uma das soluções encontradas, segundo conta, foi pegar os materiais do ano anterior para complementar, enquanto os novos não chegam. “Eu vi que tinha uns itens em bom estado e juntei com os oferecidos pela escola. O caixa escolar não tem dinheiro e não tem previsão para chegar. A situação é bem complicada”, disse.

Atraso

Outra professora de uma escola municipal no bairro São Bernardo, na região Norte da capital, relatou que a instituição foi pega de “surpresa” ao ser informada de que os materiais dos kits não seriam enviados no início deste ano. Segundo ela, em anos anteriores, os itens escolares costumavam chegar por volta do dia 20 de janeiro, permitindo que as monitoras organizassem a distribuição. “A diretora sempre realizava uma reunião antes do início das aulas para separar os kits. Assim, já na primeira semana, os alunos levavam os materiais novos para casa”, explicou.

Ao contrário de outras escolas da reportagem, a professora relatou que a diretora já conseguiu viabilizar a compra dos materiais utilizando os recursos da caixa escolar. No entanto, como o processo de aquisição, seleção e distribuição dos itens leva tempo, a orientação é que, até lá, os alunos utilizem os materiais do ano passado que ainda estiverem em boas condições, já que a instituição não tem estoque. “A direção pediu que os pais enviassem os cadernos do período letivo anterior que ainda tivessem folhas brancas até resolver essa situação, assim como lápis e borrachas em bom estado”, contou.

Para a professora, o retorno dos alunos às aulas sem materiais e uniformes novos representa um “descaso”. “Eles merecem chegar e ter, pelo menos, o básico para estudar. Nossa escola conseguirá adquirir os itens, mas ainda não há previsão de quando poderemos distribuí-los”, afirmou.

Entenda

Escolas da rede municipal de Belo Horizonte terão que arcar com a compra do kits escolares entregues todos os anos aos alunos, diferente do que ocorre tradicionalmente, em que são fornecidos com recursos da Secretaria Municipal de Educação. O problema se agrava porque, de acordo com a categoria que representa os professores, somente na última sexta-feira (31), menos de uma semana para o início das aulas, as escolas foram notificadas sobre a alteração, em meio a uma mudança de diretores, e não tiveram tempo para compras. Com isso, pais e professores temem pelos prejuízos da decisão.

Após a decisão da pasta, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (Sind-Rede/BH) afirmou que os kits, que incluem cadernos, lápis, borrachas, canetas e outros materiais essenciais disponibilizados, sobretudo para alunos de famílias vulneráveis, vão precisar ser comprados diretamente pelas instituições, por meio das caixas escolares. No entanto, muitas delas não sabem como viabilizar a compra, o que poderá atrasar a entrega aos estudantes.

Vanessa Portugal, da Diretoria Colegiada do Sind-Rede/BH, explica que as caixas escolares são estruturas jurídicas vinculadas às escolas, responsáveis por receber os recursos destinados às despesas educacionais. Cada unidade conta com sua própria caixa, presidida pelo diretor ou diretora da instituição. “Em conversa com a secretaria, nos foi informado que boa parte das caixas escolares teria recursos suficientes para a compra dos kits. Porém, o valor disponível não é uniforme em todas as escolas, devido a diversos fatores. Ou seja, embora tenha feito o comunicado, não houve definição, liberação ou provisionamento da verba”, explica.

O BHAZ entrou em contato com a Secretaria Municipal de Educação e questionou se a pasta tem ciência da falta de dinheiro das caixas escolares; se será enviado recursos às escolas e, caso, sim, qual é o prazo estimado; e quais medidas serão tomadas para minimizar os impactos até que a verba seja disponibilizada. Até o fechamento dessa reportagem, não houve retorno, mas o espaço segue aberto.

Em nota, enviada na semana passada, a Secretaria Municipal de Educação confirmou que, em 2025, os kits escolares (compostos por lápis, borracha, apontador e caneta hidrocor, entre outros materiais de uso individual) serão adquiridos por cada escola, com recursos do caixa escolar. As diretorias regionais foram orientadas sobre a sistemática e aquelas unidades que não dispõem de verba suficiente receberão repasses da SMED para a compra. Por fim, a PBH defende que “não haverá impacto no processo de aprendizagem, pois todas as escolas possuem o material básico para iniciar o ano letivo”.

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