Tragédia de Mariana: julgamento contra BHP começa hoje em Londres

Começa hoje (21), em Londres, o julgamento que definirá se a mineradora anglo-australiana BHP Billiton é responsável pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, região Central de Minas Gerais, em 2015. A tragédia matou 19 pessoas, destruiu comunidades e contaminou o Rio Doce. Essa barragem pertencia à Samarco, uma joint-venture entre a BHP Brasil e a Vale.

Cerca de 620 mil atingidos integram esta ação judicial, cujo julgamento tem previsão para durara até 5 de março (veja cronograma abaixo). São 12 semanas de depoimentos, apresentação de provas e declarações de peritos. O processo começou em 2018, mas a Justiça inglesa decidiu julgar o caso só em 2022, a Justiça inglesa decidiu julgar a ação.

O escritório de advocacia Pogust Goodhead (PG) representa as 620 mil pessoas, 46 municípios e 1.500 empresas atingidas pelo rompimento da barragem, no processo que corre na Corte de Tecnologia e Construção de Londres. Os atingidos, incluindo comunidades indígenas, igrejas e empresas, reivindicam cerca de R$ 230 bilhões em indenizações.

Os reclamantes argumentam que a mineradora BHP deve ser responsabilizada, uma vez que era controladora da Samarco, portanto, responsável por suas decisões comerciais, beneficiária e financiadora da atividade de mineração que causou a tragédia.

Segundo os advogados, é possível deduzir que a BHP tinha conhecimento dos riscos do rompimento da barragem, devido a fatores como a participação de executivos da empresa nas reuniões do conselho e de comitês da Samarco, a aprovação e financiamento de projetos relevantes de sua controlada no Brasil e de auditorias constantes na joint-venture.

Além disso, segundo o escritório de advocacia, declarações feitas por executivos da BHP após o desastre mostrariam que a empresa já havia identificado o risco em Mariana e havia recebido, inclusive, um laudo técnico que apontava um possível rompimento da barragem.

A base legal do julgamento será o direito brasileiro, amparada nas legislações ambiental e civil do Brasil, apesar de o processo correr em um tribunal britânico.

“Embora as leis processuais sejam as sejam as leis inglesas, a lei material, com relação à responsabilização e a quantificação do dano, é brasileira. Isso é muito interessante porque proporciona um exercício de soberania da legislação brasileira. A lei deve ser obedecida por qualquer parte mesmo por multinacionais que operam no Brasil e que repatriam os seus lucros para fora do Brasil”, explica a porta-voz do escritório, Ana Carolina Salomão.

A Vale, sócia da BHP na Samarco, não é ré neste processo que corre na Justiça britânica, mas um acordo entre as duas empresas indica que cada uma arcará com metade dos custos dessas futuras indenizações, caso a BHP seja condenada.

Outro processo foi impetrado pelo Pogust Goodhead contra a Vale, já na Justiça holandesa, uma vez que a mineradora brasileira tem subsidiária na Holanda. Acordos reparatórios que sejam firmados no Brasil, envolvendo as mineradoras, a União e os governos de Minas Gerais e Espírito Santo, não afetam os processos internacionais, segundo o PG.

No entanto, segundo o escritório de advocacia, caso a BHP deseje fazer um acordo com seus clientes, isso pode ser feito a qualquer momento, antes ou depois do julgamento no tribunal britânico.

Na última segunda-feira (14), uma liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino impediu que municípios paguem honorários de contratos de risco (chamados de honorários de êxito ou taxa de sucesso) nas ações perante tribunais estrangeiros sem que a Justiça brasileira, principalmente o STF examine previamente a legalidade desses atos.

De acordo com a porta-voz do PG, Ana Carolina Salomão, a decisão do ministro do STF não terá impactos na atuação do escritório no processo britânico. “O fato de que ele vai eventualmente avaliar a legalidade do contrato, em nada impede o julgamento em Londres. E é bem importante dizer que os municípios [autores] são 46, mas representamos 620 mil indivíduos, que vão à corte de Londres, que vão buscar Justiça”.

Resposta da BHP

Em nota, a BHP afirma que a ação no Reino Unido duplica e prejudica os esforços em andamento no Brasil.

“A BHP refuta as alegações acerca do nível de controle em relação à Samarco, que sempre foi uma empresa com operação e gestão independentes. Continuamos a trabalhar em estreita colaboração com a Samarco e a Vale para apoiar o processo contínuo de reparação e compensação em andamento no Brasil”.

O texto cita ainda a Fundação Renova, criada em 2016 como parte do primeiro acordo com as autoridades públicas brasileiras, por meio do qual, segundo a BHP, já foram destinados mais de R$ 37 bilhões em auxílio financeiro emergencial, indenizações, reparação do meio ambiente e infraestruturas para aproximadamente 430 mil pessoas, empresas locais e comunidades indígenas e quilombolas.

A mineradora classifica o rompimento da barragem de Fundão da Samarco como “uma tragédia” e afirmou que sua “profunda solidariedade permanece com as famílias e comunidades atingidas”.

Cronograma do julgamento da BHP

  • 21 a 24 de outubro: declarações iniciais das partes;
  • 28 de outubro a 14 de novembro: interrogatório das testemunhas da defesa;
  • 18 de novembro a 19 de dezembro: oitiva de especialistas brasileiros;
  • 20 de dezembro a 13 de janeiro: recesso;
  • 13 a 16 de janeiro: oitiva de especialistas;
  • 17 de janeiro a 23 de fevereiro: prazo para as alegações finais;
  • 24 de fevereiro a 5 de março: apresentarão das alegações finais.

Tragédia de Mariana

A barragem de Fundão, da mineradora Samarco, rompeu no dia 05 de novembro de 2015. A tragédia matou 19 pessoas, deixou centenas de famílias desabrigadas e varreu comunidades. Parte da lama de rejeitos de minério caiu nos rios Gualaxo do Norte, Carmo e Doce, chegando até o Oceano Atlântico, pelo litoral do Espírito Santo.

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