Benefícios e riscos da oferta de livros virtuais por provedores

Por Fabrício Viana (*)

Usada por provedores de Internet de todos os portes – incluindo as grandes teles –, a oferta gratuita de livros digitais é um dos SVAs que mais agrega valor às marcas das empresas, por vinculá-las ao acesso à cultura. A disponibilização desse serviço aos clientes, porém, exige cuidados: embora seja um benefício que gera ganho institucional, também pode resultar em problemas sérios futuramente.

A demanda de ISPs pelo serviço faz com que muitas empresas ingressem nesse mercado. Nem todas atuam de forma adequada para que suas ofertas se enquadrem na definição do que é um SVA, ou seja, “atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações”, como estabelece o artigo 61 a LGT.

Essa classe de serviços – que inclui, além do acesso a livros, streaming de vídeo, cursos, serviços de segurança online etc. – não é regulada pela Anatel. Apesar disso, a agência monitora a atividade particularmente quanto à sua participação nas receitas dos provedores.

Sem incidência de ICMS, SVAs possuem carga tributária muito inferior à de SCMs. Isso faz com que muitos ISPs utilizem artificialidades contábeis para atribuírem receitas provenientes do provimento de acesso à Internet a Serviços de Valor Adicionado.

Por conta dessa prática, o regulador exige, em sua Coleta de Dados Econômico-financeiros e Técnico-operacionais – a semestral –, informações sobre os ganhos dos provedores obtidos com a comercialização de SVAs e outros sobre os quais não arbitra. Além disso, direciona sua fiscalização preferencialmente aos que atribuem a partir de 40% de suas receitas às vendas relacionadas a essa classe de serviços.

Diferentemente de streaming de vídeo ou da venda de pacotes de TVs, cursos e outros SVAs que, com a reforma tributária, passarão a ter a mesma carga de impostos que incide sobre SCMs, a oferta de livros continuará usufruindo dos incentivos fiscais existentes hoje.

Todavia, duas premissas básicas devem ser seguidas para evitar problemas na contratação de plataformas de leitura: o livro deve sempre possuir cadastro ISBN e, o mais importante, deve possuir valor de mercado. Ou seja, deve estar à venda nas prateleiras virtuais brasileiras pela mesma editora.

Para ser comercializado, todo livro deve dispor do ISBN (International Standard Book Number), padrão numérico internacional que identifica diversos tipos de publicações. Editores e vendedores – incluindo as plataformas que fornecem acesso a esse tipo de conteúdo – podem fazê-lo dispondo de obras que possuem apenas esse registro. Portanto apostilas e outros pequenos textos que não possuem ISBN não devem ser oferecidos pelos provedores a seus clientes.

O ponto mais importante que o provedor deve se atentar é o valor de mercado dos livros que irá vender: os mesmos livros, da mesma editora, oferecidos pela plataforma SVA, devem obrigatoriamente estar à venda no mercado por outras livrarias. Se no mercado o livro custa R$30,00, o valor deve ser algo parecido com isso. Porém, se o livro não existe em nenhuma livraria, o que justifica o preço vendido por ele pelo ISP? É nesse quesito em que o provedor mais se arrisca. Assim, apenas obras que estão à venda em lojas físicas ou virtuais – portanto, devidamente precificadas – podem servir para tal fim.

Não é o que ocorre com os títulos disponibilizados por muitas plataformas que atuam junto a ISPs. Um exemplo comum é o uso de obras que estão em domínio público que, ao ganharem nova edição e respectivo ISBN, são disponibilizadas apenas nessas prateleiras virtuais.

Fornecedores que atuam dessa forma expõem ISPs a autuações de fiscais da Fazenda de seus estados e da Anatel. Não havendo base de comparação para o cálculo do abatimento tributário – ou seja, o preço do produto –, a oferta de acesso a livros que não estão no mercado pode ser interpretada como falsa atribuição do fato gerador do tributo voltada à sonegação fiscal. Além disso, ao invés de SVA, o serviço poderá ser enquadrado como SCM.

Nesses casos, a Secretaria da Fazenda poderá, além de autuar e multar o provedor, realizar a cobrança de ICMS, retroativa a há até cinco anos, multiplicada pelo número de usuários a quem o benefício foi disponibilizado. Já perante à Anatel, além de sanções diversas, haverá a cobrança – também retroativa – das contribuições a FUST e FUNTTEL.

À medida em que a competição se acirrava em seu segmento, provedores de Internet passaram a recorrer mais e mais aos SVAs como forma de diferenciarem-se da concorrência. Muitas empresas, porém, valeram-se desses serviços, não para conquistar clientes, mas para sonegar impostos. Tanto o Fisco quanto a agência reguladora estão atentos a essa prática, principalmente quando os incentivos fiscais são mais significativos.

É importante destacar que sempre deve ser comparado o mesmo livro da mesma editora. Vários livros possuem mais de uma editora. Portanto, não se pode precificar o livro num pacote com base no valor de um livro de mesmo título mas de outra editora, pois são produtos diferentes. O ISP deve ter em mente que o valor do livro ofertado no pacote deve girar sempre no valor de mercado do livro. Se o livro não existe no mercado, não deve existir no seu pacote de serviços.

(*) Fabrício Viana é sócio da VianaTel, consultoria especializada na regularização de ISPs, e da Braslivros, plataforma de disponibilização de acesso a E-books.

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