
O Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou, nesta quarta-feira (02), a realização de uma ampla auditoria nos benefícios sociais pagos pelos governos federal, estaduais e municipais. A medida busca identificar fragmentações, sobreposições, duplicidades e lacunas nos programas de transferência de renda em vigor no país. A iniciativa faz parte do plano de trabalho da Rede Integrar de Políticas Públicas Descentralizadas para o ano de 2025.
Com a decisão, o TCU dará início a uma fiscalização inédita em termos de alcance e profundidade, envolvendo os diferentes entes federativos e concentrando esforços especialmente nos programas de assistência social, como o Bolsa Família e iniciativas regionais equivalentes.
Por que o TCU vai fiscalizar os benefícios sociais?

Aumento dos gastos e necessidade de coordenação
Nos últimos anos, os programas de transferência de renda se tornaram fundamentais para milhões de brasileiros em situação de vulnerabilidade. Contudo, o crescimento acelerado dessas iniciativas — muitas vezes implementadas de forma descentralizada — tem gerado preocupações quanto à eficiência dos recursos públicos e à coordenação entre os entes federativos.
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Segundo o TCU, há indícios de fragmentações e sobreposições que podem levar ao pagamento duplicado de benefícios ou à exclusão de famílias que realmente necessitam do auxílio. A nova auditoria tem como objetivo central garantir que os recursos estejam sendo utilizados com justiça, foco e transparência.
Envolvimento da Rede Integrar
A fiscalização será coordenada no âmbito do grupo temático 1 do plano de trabalho da Rede Integrar, entidade voltada à fiscalização integrada de políticas públicas descentralizadas. Essa rede congrega os tribunais de contas estaduais, municipais e o próprio TCU, promovendo ações articuladas entre os órgãos de controle.
Como será feita a auditoria dos benefícios sociais?
Responsabilidade técnica da AudBenefícios
A proposta de auditoria foi apresentada pela Unidade de Auditoria Especializada em Previdência, Assistência e Trabalho (AudBenefícios), uma divisão técnica do TCU com foco específico em benefícios sociais. A Secretaria de Controle Externo de Contas Públicas (SecexContas) aprovou o plano de ação da auditoria, que será implementado ao longo de 2025.
Etapas da fiscalização
A fiscalização será dividida em três fases principais:
Diagnóstico e levantamento de dados
Nesta primeira etapa, a equipe de auditoria reunirá informações sobre os diferentes programas de transferência de renda executados em todas as esferas de governo. O objetivo é mapear o escopo, os critérios de elegibilidade e os públicos-alvo de cada iniciativa.
Identificação de sobreposições e lacunas
Com base nos dados coletados, o TCU e os tribunais de contas parceiros buscarão identificar onde existem pagamentos duplicados, beneficiários excluídos ou conflitos entre critérios de elegibilidade.
Recomendações e ações corretivas
Ao final da auditoria, serão elaborados relatórios com recomendações para aprimorar a governança dos programas de transferência de renda, aumentar sua eficácia e promover a justiça social. O TCU também poderá propor medidas legislativas e administrativas, conforme os resultados encontrados.
Programas que podem ser auditados
Iniciativas federais
Entre os programas da União que devem ser alvo da fiscalização estão:
- Bolsa Família
- Benefício de Prestação Continuada (BPC)
- Auxílio Gás dos Brasileiros
- Programa Pé-de-Meia
- Auxílio Emergencial (em eventuais remanescentes ou revisões)
Programas estaduais e municipais
Diversos estados e municípios criaram seus próprios programas de transferência de renda, especialmente após a pandemia da Covid-19. A auditoria pretende analisar essas políticas regionais para verificar sua complementaridade ou sobreposição com os benefícios federais.
Exemplos incluem:
- Renda Cidadã (Goiás)
- Auxílio Brasil Paulista (São Paulo)
- Cartão Cria (Alagoas)
- Auxílio Municipal Emergencial (em diversas cidades)
Impactos esperados da fiscalização
Redução de fraudes e desperdício
Com a auditoria, espera-se que o país consiga reduzir significativamente casos de pagamentos indevidos e fraudes estruturais. Um relatório do próprio TCU de 2023 apontou mais de R$ 300 milhões em pagamentos irregulares em programas sociais, muitos deles decorrentes de falta de integração entre os bancos de dados.
Melhoria na focalização dos recursos
Ao identificar sobreposições e lacunas, o governo poderá melhorar a focalização dos programas, assegurando que os recursos cheguem a quem realmente precisa. Isso pode resultar em maior eficiência social, com mais impacto por real investido.
Propostas de unificação ou interoperabilidade
Outro possível desdobramento é o avanço em propostas de unificação de cadastros ou sistemas de interoperabilidade entre os entes federativos. Atualmente, muitos estados e municípios mantêm bancos de dados próprios, o que dificulta a verificação de duplicidades.
Como funciona a Rede Integrar
Integração entre órgãos de controle
A Rede Integrar foi criada para promover ações conjuntas entre o TCU, Tribunais de Contas Estaduais (TCEs) e Tribunais de Contas dos Municípios (TCMs), com o objetivo de aprimorar a fiscalização de políticas públicas descentralizadas. A ideia é superar os limites de competência isolada e proporcionar uma visão mais ampla dos desafios enfrentados pelo Brasil.
Plano de trabalho 2025
O plano de trabalho da Rede Integrar para 2025 é composto por diversos grupos temáticos. O grupo 1, dedicado à assistência social, é o responsável pela auditoria dos benefícios sociais. Outros temas abordados pela rede incluem saúde, educação, meio ambiente e infraestrutura.
O que pode mudar após a auditoria?

Recomendações para o governo federal
Com os resultados em mãos, o TCU poderá sugerir ao governo federal mudanças legislativas ou regulamentares, como:
- Integração entre sistemas de cadastro social
- Criação de um comitê nacional de coordenação dos programas
- Revisão de critérios de elegibilidade para maior equidade
Apoio técnico aos estados e municípios
Os governos locais também devem se beneficiar das recomendações do TCU. A expectativa é que os tribunais de contas estaduais repassem orientações específicas para cada região, respeitando as particularidades locais.
Considerações finais
A autorização concedida pelo Tribunal de Contas da União marca um passo importante rumo à maior transparência e eficiência na administração dos benefícios sociais no Brasil. A fiscalização de programas de transferência de renda é uma demanda antiga da sociedade civil e dos especialistas em políticas públicas, especialmente diante da crescente necessidade de garantir justiça social e equilíbrio fiscal.