
O Regime Geral da Previdência Social (RGPS) pode enfrentar um rombo acumulado de R$ 29,9 trilhões até o ano de 2100, caso nenhuma medida estrutural seja adotada para conter o desequilíbrio entre receitas e despesas do sistema. O número representa 11,61% do Produto Interno Bruto (PIB) projetado para aquele ano.
A estimativa está no Balanço Geral da União de 2024, divulgado nesta quinta-feira (3), pelo Tesouro Nacional. O documento apresenta uma radiografia preocupante das contas da Seguridade Social brasileira, especialmente no que diz respeito ao financiamento da Previdência pública.
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Déficit da Previdência cresce de forma acelerada
Projeção para 2025 já indica rombo de R$ 338,1 bilhões
De acordo com os dados oficiais, a necessidade de financiamento do RGPS em 2025 é estimada em R$ 338,1 bilhões, o que equivale a 2,68% do PIB nacional. O número representa um crescimento contínuo da insuficiência de receitas frente às despesas com aposentadorias, pensões e demais benefícios previdenciários.
O Tesouro Nacional alerta que, sem reformas, o desequilíbrio deve se aprofundar nas próximas décadas, até culminar no déficit trilionário estimado para o fim do século.
“As receitas previdenciárias serão insuficientes para a cobertura das respectivas despesas no horizonte de 76 anos”, afirma o relatório.
Principais causas do déficit previdenciário
1. Envelhecimento da população
Um dos principais fatores por trás do desequilíbrio é o envelhecimento acelerado da população brasileira. Segundo projeções do IBGE, o Brasil passará a ter mais idosos do que jovens já nas próximas décadas.
Esse processo demográfico reduz a proporção de trabalhadores ativos (que contribuem para o sistema) em relação ao número de beneficiários aposentados, agravando o desequilíbrio entre receitas e despesas.
2. Crescimento da informalidade
Outro ponto de alerta é o aumento da informalidade no mercado de trabalho, que reduz a base de contribuintes para o RGPS. Trabalhadores informais, autônomos e sem registro em carteira não recolhem regularmente a contribuição previdenciária, o que prejudica o equilíbrio financeiro do sistema.
A informalidade é especialmente elevada em setores como comércio ambulante, agricultura familiar e serviços pessoais, que cresceram nos últimos anos com o avanço de plataformas digitais e da gig economy.
Histórico: a reforma da Previdência de 2019

Medidas importantes, mas insuficientes
A última reforma previdenciária, aprovada durante o governo Jair Bolsonaro (PL) em 2019, foi considerada um passo relevante na contenção do rombo previdenciário. A Emenda Constitucional nº 103 alterou regras de aposentadoria, como:
- Idade mínima para aposentadoria (62 anos para mulheres e 65 para homens);
- Tempo mínimo de contribuição;
- Mudança na fórmula de cálculo dos benefícios;
- Regras de transição para quem já estava no mercado de trabalho.
Apesar disso, a reforma não foi suficiente para garantir a sustentabilidade do sistema no longo prazo, sobretudo diante de mudanças estruturais na demografia e no mercado de trabalho.
O que dizem os especialistas
Nova reforma pode ser inevitável
Economistas e especialistas em Previdência defendem que uma nova reforma deverá ser discutida nos próximos anos, com foco em adequar o sistema às novas realidades populacionais e econômicas.
Segundo Paulo Tafner, economista e especialista em finanças públicas, o desafio é combinar equilíbrio fiscal com justiça social:
“A previdência precisa ser reformada com base em dados demográficos reais. O envelhecimento da população brasileira exige um novo modelo de financiamento mais equilibrado, sob risco de colapso fiscal”, afirma Tafner.
Outros analistas sugerem modelos híbridos, como a criação de sistemas de capitalização complementar ou a ampliação da arrecadação via impostos sobre grandes fortunas e rendas altas.
Trajetória futura do rombo previdenciário
Projeções mostram curva ascendente até o fim do século
O Tesouro Nacional elaborou um infográfico com a projeção da necessidade de financiamento do RGPS até 2100. Veja os destaques da trajetória:
Ano | Déficit estimado | % do PIB |
---|---|---|
2025 | R$ 338,1 bi | 2,68% |
2040 | R$ 1,2 tri | 4,92% |
2060 | R$ 6,4 tri | 7,98% |
2100 | R$ 29,9 tri | 11,61% |
A curva ascendente demonstra que quanto mais o tempo passa sem mudanças, mais difícil e custoso será equilibrar o sistema, o que pode comprometer investimentos em outras áreas essenciais como educação, saúde e infraestrutura.
Possíveis caminhos para conter o rombo
Reformas, formalização e ajustes fiscais
Algumas propostas já circulam entre especialistas, parlamentares e órgãos técnicos do governo. Entre elas:
1. Nova reforma da Previdência
- Revisão das regras de transição;
- Revisão das aposentadorias especiais;
- Discussão sobre idade mínima futura ajustada à expectativa de vida.
2. Incentivos à formalização
- Redução da carga tributária sobre a folha;
- Estímulo a modelos de contratação com vínculo formal;
- Integração de plataformas digitais ao sistema de contribuição.
3. Combate à sonegação e fraudes
- Uso de tecnologia para rastrear contribuições;
- Ações mais severas contra empresas que não recolhem INSS.
4. Fontes alternativas de financiamento
- Debate sobre impostos progressivos para complementar o RGPS;
- Fortalecimento dos fundos previdenciários estaduais e municipais.
Impacto social e político do cenário

Pressão sobre os futuros governos
Com a projeção de déficit crescente, o tema da sustentabilidade da Previdência deve ganhar cada vez mais espaço no debate político nacional, sobretudo em anos eleitorais. Medidas impopulares, como aumentar a idade mínima ou alterar o valor dos benefícios, costumam encontrar resistência de diversos setores da sociedade.
No entanto, a manutenção do atual modelo sem mudanças pode levar a uma situação insustentável, afetando não só as contas públicas, mas também a confiança de investidores e a capacidade do Estado de financiar políticas sociais.
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