
O Brasil registrou, no primeiro trimestre de 2025, a maior saída líquida de dólares da série histórica, iniciada em 1982. De acordo com dados divulgados pelo Banco Central, o saldo do fluxo cambial ficou negativo em US$ 15,8 bilhões, superando até mesmo o cenário de crise global causado pela pandemia de covid-19 em 2020, quando o déficit no mesmo período foi de US$ 11,4 bilhões.
Essa nova marca negativa reflete um momento de incerteza internacional, instabilidade econômica e fuga de capitais que deve impactar diretamente o câmbio, o mercado financeiro e a confiança no país como destino de investimentos.
Leia mais:
Alimentos devem ficar mais baratos em breve, afirma ministro

O que é fluxo cambial?
O fluxo cambial é a diferença entre a entrada e a saída de dólares no país. Ele é dividido em duas contas principais:
Canal comercial
Refere-se às operações relacionadas a exportações e importações de mercadorias, além de ajustes comerciais e operações específicas como encomendas internacionais.
Canal financeiro
Inclui investimentos estrangeiros diretos e em carteira, remessas de lucros e dividendos e transferências internacionais de capitais.
No 1º trimestre de 2025:
- Canal financeiro registrou uma saída líquida de US$ 23,1 bilhões
- Canal comercial teve uma entrada líquida de US$ 7,3 bilhões
Mesmo com superávit comercial, a fuga intensa do capital financeiro foi suficiente para causar o pior saldo líquido da história em termos cambiais.
Comparativo histórico: 2025 supera pandemia e crise de 1999
Até então, o maior fluxo cambial negativo da história havia sido registrado no 1º trimestre de 1999, quando o país atravessava uma grave crise cambial após a adoção do câmbio flutuante. Na época, o déficit foi de US$ 13,7 bilhões.
Em 2020, com a chegada da covid-19 e a paralisação econômica global, o saldo negativo foi de US$ 11,4 bilhões, número que agora também foi superado.
Recorde mensal também foi quebrado
Somente em março de 2025, o país teve saída líquida de US$ 8,3 bilhões — o maior valor mensal da série histórica. O recorde anterior era de US$ 6,6 bilhões, registrado em março de 2020, o primeiro mês da pandemia.
O que motivou a fuga histórica de dólares?
Vários fatores se somam para explicar o momento delicado da economia brasileira no cenário internacional:
Incertezas na política econômica dos EUA
O aumento das tensões em relação à política de taxação do comércio internacional por parte dos Estados Unidos tem deixado os mercados mais avessos ao risco. Com a possibilidade de novas barreiras comerciais e mudanças tributárias globais, investidores buscam proteger seus ativos, retirando recursos de economias emergentes.
Instabilidade política e econômica no Brasil
Apesar de um cenário de crescimento moderado, o Brasil ainda enfrenta inseguranças fiscais, ruídos políticos e desconfiança quanto à condução da política monetária. Tudo isso afeta diretamente a percepção internacional sobre a estabilidade do país.
Aumento das remessas ao exterior
As empresas multinacionais com sede no Brasil estão enviando mais lucros e dividendos para suas matrizes no exterior, movimento comum em momentos de valorização do dólar e incerteza econômica.
Como o Banco Central calcula esse fluxo?

O fluxo cambial é divulgado semanalmente por meio do relatório “Movimento de Câmbio Contratado”, do Banco Central do Brasil. Este levantamento considera as operações de compra e venda de moeda estrangeira realizadas pelos bancos comerciais com clientes do setor não financeiro.
Metodologia
O cálculo exclui:
- Contratos de câmbio interbancário
- Intervenções cambiais do Banco Central
- Operações externas do BC
- Encomendas internacionais
- Ajustes em transações comerciais específicas
O foco é medir as operações efetivas entre o setor financeiro e o setor real da economia.
Impactos da fuga de dólares para o Brasil
A maior saída de dólares da história traz sérias consequências para a economia brasileira e acende alertas nos setores público e privado.
Pressão sobre o câmbio
Com menos dólares circulando no país, a tendência é de valorização da moeda norte-americana, o que pode pressionar a cotação do dólar comercial. Isso tem efeitos diretos sobre os preços dos produtos importados, combustíveis e insumos industriais.
Inflação e juros
Com a possível alta do dólar, há risco de aumento da inflação, o que pode forçar o Banco Central a manter ou até elevar os juros. Isso impacta negativamente o consumo, os investimentos e o crescimento econômico.
Menor atratividade para investidores
A fuga de capital mostra que o Brasil está se tornando menos atrativo para os investidores internacionais. Esse cenário dificulta a captação de recursos para projetos, infraestrutura e desenvolvimento.
Perspectivas para os próximos meses
A depender da evolução da política econômica dos Estados Unidos e das medidas que o governo brasileiro tomará para restaurar a confiança dos mercados, o fluxo cambial pode se estabilizar ou se agravar.
Possíveis cenários
- Estabilização externa: Caso os EUA sinalizem medidas menos agressivas na taxação do comércio internacional, pode haver recuperação parcial da confiança nos emergentes.
- Reformas internas: Avanços em reformas tributária e fiscal podem atrair novamente o capital estrangeiro.
- Crise prolongada: Se a instabilidade global e doméstica persistirem, o Brasil pode continuar registrando fuga de capitais, comprometendo sua recuperação econômica.
O que pode ser feito?

Especialistas apontam que, para reverter a tendência de fuga de dólares, o Brasil precisa agir em diversas frentes:
Medidas recomendadas
- Reforçar o compromisso com o equilíbrio fiscal
- Reduzir a instabilidade política
- Atrair investimento produtivo, com incentivos e segurança jurídica
- Estimular a diversificação das exportações
- Ampliar acordos internacionais de comércio
Imagem: Freepik/ Edição: Seu Crédito Digital