Os riscos do transtorno do luto prolongado


Livro organizado pelas psicólogas Erika Pallottino e Cecília Rezende aborda esse quadro de sofrimento que pode se estender por anos. Em 2012, as psicólogas Erika Pallottino e Cecília Rezende criaram o Instituto Entrelaços, especializado no tratamento do luto. No dia a dia da clínica, se depararam com uma questão ainda mais complexa: o transtorno do luto prolongado. Essa é uma condição que atinge aproximadamente 10% das pessoas enlutadas, que não conseguem lidar com a nova realidade sem o ente querido. O isolamento e a angústia podem se estender, sem alívio, por meses e até anos. A perturbação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento emocional, social e profissional.
Transtorno de luto prolongado: condição de sofrimento emocional pode se estender por anos
Cocoparisienne para Pixabay
“Desde 2015, eu e Cecilia passamos a estudar aprofundadamente as questões envolvendo os lutos graves, que fogem do curso esperado do luto e cuja frequência vem crescendo de forma relevante. Mesmo que seja uma parcela pequena da população, é um grupo em intenso sofrimento”, afirma Pallottino.
A avaliação de que o problema não era explorado em toda a sua dimensão na formação dos profissionais da área levou as duas a buscar treinamento e certificação pela Columbia University. Ali ouviram da professora Katherine Shear que enlutados graves podem não responder a abordagens convencionais. A dupla foi além: no dia 3 de abril, Pallottino e Rezende lançam, no Rio de Janeiro, o livro “Transtorno de luto prolongado: estudos, reflexões e possibilidades de cuidados”. São as organizadoras da obra, que conta com textos de alguns dos principais especialistas sobre o tema – como a pesquisadora Holly Prigerson, da Cornell University – e também assinam um capítulo, no qual escrevem:
“A dinâmica desse luto toma um caminho desviante. Alguns enlutados permaneciam por anos, até décadas, sentindo uma dor emocional intensa e desestabilizante”.
O transtorno do luto prolongado é um quadro incapacitante, que envolve o risco de suicídio e disfuncionalidade, tanto que foi incluído na Classificação Internacional de Doenças (CID-11) e no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5-TR).
São pacientes que, com frequência, relatam uma longa trajetória de tentativas de tratamento, incluindo psicoterapias e abordagens alternativas, na tentativa de aliviar o que sentem. No entanto, mesmo com o passar do tempo, há um estado de sofrimento que consome o psiquismo.
Embora seja voltado para um público especializado, a leitura pode interessar a uma gama bem mais ampla de leitores, porque também traz a descrição de casos e a discussão sobre formas de tratamento. Um dos capítulos aborda o medicamento naltrexona, que tem se mostrado útil no manejo do estrangulamento que o luto causa na vida dos enlutados, apesar de ainda não haver nenhum estudo que tenha demonstrado, de forma definitiva, sua eficácia.
A psicóloga doutora Laura Teixeira Bolaséll assina um texto instigante que discorre sobre uma possível relação entre a pandemia de Covid-19 e o crescimento do número de casos de transtorno de luto prolongado. Com mais de 7 milhões de mortes confirmadas globalmente pela Organização Mundial da Saúde, o Brasil ocupa a segunda posição, com mais de 700 mil óbitos, superado apenas pelos Estados Unidos.
Reproduzo algumas características do distúrbio, lembrando que, para se chegar a um diagnóstico, é indispensável a avaliação de um profissional qualificado.
A morte da pessoa próxima ter ocorrido há pelo menos 12 meses (para crianças e adolescentes, esse prazo cai para seis meses), ou seja, não se trata de algo recente. Aqui vale uma observação: as autoras enfatizam que, das inúmeras maneiras trágicas pelas quais o luto acontece, a perda de um ente querido por suicídio está entre as mais difíceis, cujo impacto se encontra bem documentado.
Sentir como se uma parte de si tivesse morrido – é a chamada perturbação na identidade.
Dificuldades de reintegração aos relacionamentos e atividades, como estar com amigos, buscar interesses ou planejar o futuro.
Apatia emocional, solidão intensa e a ideia de que a vida perdeu o sentido.
Psicóloga orienta como lidar com o luto e aceitar a morte
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