
Em um ambiente global marcado por incertezas econômicas, inflação persistente e tensões comerciais crescentes, o Bitcoin (BTC) tem se destacado como um porto seguro inesperado.
De acordo com um recente relatório da market maker cripto Wintermute, publicado em 14 de abril, a criptomoeda demonstrou um comportamento atípico ao se manter estável durante uma das maiores quedas dos últimos anos nos mercados acionários tradicionais.
Enquanto o S&P 500 e o Nasdaq recuaram para seus níveis mais baixos desde 2023, e os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA atingiram máximas não vistas desde 2007, o Bitcoin se manteve firme, com uma queda considerada modesta em comparação com ativos tradicionais. Para a Wintermute, esse é um sinal claro de que a narrativa em torno do BTC pode estar mudando definitivamente.
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Uma mudança no padrão de comportamento do BTC
Adoção institucional e ETFs como pilares da estabilidade
Historicamente, o Bitcoin foi rotulado como um ativo altamente especulativo, vulnerável a choques externos e a crises. No entanto, o cenário atual demonstra uma inversão. Segundo a Wintermute, a estabilidade do BTC no atual contexto de estresse macroeconômico marca uma “mudança notável” em relação à sua performance em crises anteriores.
Essa mudança pode ser atribuída à crescente presença de investidores institucionais, que passaram a adquirir grandes volumes de Bitcoin através de produtos regulados como os ETFs (fundos negociados em bolsa).
Além disso, o posicionamento do Bitcoin como uma versão digital do ouro também fortalece sua imagem de ativo seguro em tempos de incerteza.
Comparação com dados históricos
No passado, durante quedas generalizadas do mercado, o Bitcoin frequentemente sofria perdas mais acentuadas do que o mercado tradicional.
Em contraste, durante a atual turbulência, a criptomoeda revisitou níveis semelhantes aos das eleições norte-americanas, sem rupturas graves, segundo aponta a Wintermute.
Fatores macroeconômicos por trás da estabilidade do Bitcoin
Inflação começa a recuar nos EUA
Na última semana, o preço do Bitcoin subiu cerca de 7%, alcançando US$ 83.700 e chegando a tocar os US$ 86.000. Esse movimento ocorreu paralelamente à divulgação dos últimos índices de inflação norte-americanos.
O Índice de Preços ao Consumidor (CPI) anualizado subiu 2,4%, mas registrou queda de 0,1% na comparação mensal — a primeira redução desde maio de 2020.
Já o Índice de Preços ao Produtor (PPI) mostrou aumento de 2,7% em março, contra 3,2% em fevereiro, reforçando sinais de uma tendência desinflacionária. Esses indicadores apontam que o Federal Reserve (Fed) pode estar se aproximando de sua meta de inflação de 2%, o que ameniza expectativas de novos aumentos nas taxas de juros.
Tensões comerciais elevam o risco inflacionário
Contudo, a Wintermute alerta que as tensões comerciais globais ainda representam ameaças significativas. “Apesar do progresso rumo à meta de inflação, as recentes escaladas nas tensões comerciais globais introduzem novos riscos inflacionários”, afirma o relatório.
Donald Trump, que voltou a disputar a presidência dos EUA, defende uma política comercial mais agressiva, com tarifas sobre semicondutores e produtos eletrônicos. Isso pode resultar em inflação indireta via encarecimento de insumos industriais e tecnológicos.
Bitcoin como alternativa a ativos tradicionais

Investidores se voltam para o ouro digital
Com o aumento das incertezas, analistas acreditam que os investidores passarão a buscar ativos mais seguros. Alex Obchakevich, fundador da Obchakevich Research, acredita que o BTC pode retomar sua correlação com ativos de risco, mas não descarta que ele continue a ser visto como um substituto moderno para o ouro.
Segundo ele, “os fatores que sustentam a estabilidade atual são a entrada de capital via ETFs e a consolidação do Bitcoin como um ativo independente, com regras próprias”. Esse novo status, aliado à descentralização e escassez programada do Bitcoin, pode consolidá-lo como proteção em tempos de crise.
Análise de risco: mercado espera mais turbulência
Relatórios recentes do JPMorgan apontam uma probabilidade de 60% de que os EUA entrem em recessão ainda este ano. A plataforma de previsões Kalshi eleva essa chance para 61%, com base em uma combinação de dados macroeconômicos e projeções comerciais.
Impacto nas narrativas de mercado
Bitcoin como hedge contra inflação e políticas governamentais
Historicamente, ativos como ouro e títulos do Tesouro são usados como hedge durante crises. No entanto, o crescimento das narrativas favoráveis ao Bitcoin e sua adoção institucional estão transformando a criptomoeda em um novo instrumento de proteção.
Michael Saylor, CEO da Strategy Inc., reforçou essa visão com a aquisição de mais de US$ 285 milhões em BTC recentemente. “Em um mundo de moeda inflacionária, o Bitcoin é uma ilha de previsibilidade. Nós continuamos acumulando”, afirmou Saylor.
Reconfiguração do mercado financeiro
Essa mudança de paradigma está afetando também o comportamento de instituições financeiras tradicionais. Vários fundos de pensão e bancos de investimento estão revisando suas carteiras para incluir exposição ao Bitcoin, muitas vezes via ETFs ou derivativos regulados.
Conclusão: o futuro do Bitcoin em um mundo instável

O desempenho recente do Bitcoin em meio à instabilidade macroeconômica global marca uma nova fase para o ativo digital. Longe de seu estigma inicial como uma bolha especulativa, o BTC agora se posiciona como um forte candidato a reserva de valor para o século XXI.
Com indicadores econômicos mistos, riscos inflacionários latentes e uma transformação nas dinâmicas geopolíticas e comerciais, o Bitcoin pode continuar a ganhar espaço como instrumento de proteção financeira global. A adoção institucional crescente, combinada com fundamentos técnicos e econômicos robustos, reforça sua posição de destaque.
Se a tendência continuar, o Bitcoin poderá ser cada vez mais comparado ao ouro não apenas como “reserva de valor”, mas como referência segura em um mundo de incertezas e instabilidades cíclicas.